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Friday, March 30, 2007

A rua com o meu nome

A rua tem um cheiro a maças verdes, doiradas pelo sol. No chão de pedra brilhante, caiem compassadamente folhas das arvores plantadas ao logo do eixo no centro. Apesar de alinhadas, não são simétricas. Os ramos desordenados espraiam-se para os céus, e dão à rua um ar futurista, paradoxalmente acolhedor. As folhas que vão caiando formam uma cortina que impede o Sol de marcar o rosto. E é assim que fixo as imagens, processadas por um filtro. Sabem a mel, as imagens.
Os ramos batem com o vento. Não são simétricos. Mas o acaso trouxe-os às janelas. Cada uma tem uma árvore, como se isso fosse condição necessária, sem a qual não existiriam janelas. E o vento inconstante fica pouco tempo no mesmo lugar. Enrola-se nas árvores, ás vezes pesaroso por ir embora. Indecisões rápidas que estremecem nos vidros da minha janela. Por mais que pareça o contrario, a rua é fixa. E o vento escolhe, não tem outra opção.
Ao pé das árvores, perto da porta das casas, existem bancos velhos . O jardim, ao fundo da rua, tem um lago onde nadam peixes. Ás vezes vamos ver os peixes, vê-los contemplar o Mundo enorme que conhecem. Do jardim vê-se a rua toda. Vêem-se os recantos mais sombrios, vêm-se os ramos que se baixam para o centro, as casas de pedra. Imóveis. Vêem-se as cores. Do jardim vêem-se as árvores, que apesar de juntas, não são simétricas.


P.S: Este texto nasceu de mais um desafio. O meu Muito Obrigado ao Tiago.

Thursday, March 29, 2007

Os olhos mais tristes

Um dia cansativo. Lisboa na sua azáfama não nos dá tréguas. O metro, o autocarro, o Marquês. Não há lugar para paisagens pitorescas. Dizem que a cidade é bonita. Talvez seja, gosto de andar a pé. Descer até ao Terreiro do Paço. Há coisas que descubro assim, na intermitência dos raios do sol enquanto me espreguiço contra o branco das paredes. Quando regressei a casa, sentaste-te à minha frente. E vi com desagrado, que tinhas os olhos mais tristes do dia, da semana , quem sabe do ano. Fitavas a envolvência como se os pormenores te interessassem, como se paisagem decrépita fosse um jardim exótico. Mas eu vi, os teus olhos caídos. As mãos abandonadas, cheias de manchas, o corpo flectido. Se o Mundo acabasse ali, não terias vontade de te levantar.
Discretamente observei os teus olhos. Os olhos mais tristes. Enquanto a viagem durou eu olhei para os teus olhos. Gostava de extrair essa tristeza, guardá-la num frasco. Depois levar-te a ver o Mundo, e na outra ponta do penhasco, atirar o frasco para o desconhecido. Mas tu saíste na paragem antes de mim. E desapareceste.

Sunday, March 25, 2007

Loucura

No outro dia senti esta loucura. Este formigueiro nas pontas dos dedos, que me fazem comichão enquanto vou na viagem de autocarro. E ás vezes esta loucura confunde-se com algum desejo de liberdade. Por vezes, quero ser livre de mim mesma, livre do que
penso.

Mas eis que esta música deu nome à minha loucura. Não o sei dizer em palavras, mas foi isso que ela fez, definiu o meu estado de espírito, acomodou-o. É por isso que consigo escrever, porque ela está aqui comigo e segue os meus instintos mais profundos. Orienta-os.

Ás vezes somos salvos por uma música.

Wednesday, March 21, 2007

Grito

Ás vezes podia resolver tudo num grito.
A realidade condensa-se em padrões complexos, ás vezes repetem-se, outras não: são irracionais.
Cansamo-nos a descodificá-los. Mas se não os descodificarmos, ficamos sós, na imensa planície que nos sufoca, de tanto espaço que nos oferece.
Queremos de mais. Queremos de menos. E por vezes o Mundo é apenas um quadro bonito, de passagem. Um pincelada que alguém deixou.
Outras não.
Outras, são as memórias cinzentas, a chuva que bate no passeio de manhã. O dia sem fim. Ás vezes é pior o infinito. Ás vezes é bem pior o infinito...
Resolvia tudo num grito profundo, grave, quase mudo. A frequência certa.

Thursday, March 15, 2007

Exigência

É bom passear. É bom saltar o muro do jardim, e ver o que há do outro lado. Porque há sempre outro lado, até do espelho.

Esta semana estive em Sintra. E tal como Évora, é uma cidade que me diz pouco. Talvez seja aquele clima húmido, as folhagens demasiado cerradas, talvez a visão cortada, o semblante romântico. Talvez seja isso, ou a minha exigência. A critica implicita, na maneira como olho para o que me rodeia, como se só pelo facto de estar perto fosse motivo para não ver beleza alguma.

Como um viajante cansado, cheguei a casa e fotografei a paisagem da minha janela. A janela de todos os Mundos.




Monday, March 05, 2007

Provérbio chinês

O tempo que passas a rir é tempo que passas com os deuses.

Sunday, March 04, 2007

Notas Soltas

Mais um eclipse. Adoro ver as pessoas todas a olhar o céu. De repente, parecem-se comigo. É noite de ilusão...
Desta vez, o céu não mudou espectacularmente de cor. E a Lua parecia algo perdida entre o nevoeiro da sombra da Terra... Mas ainda assim, um momento único. Inexplicavelmente único.


PS: Sexta feira voltei a fazer a viagem de Alentejo para Lisboa ao fim da tarde. Como é possível eu ter-me apaixonado pelo sítio que mais detestava? Como é posível eu nunca ter notado que ele estava lá, à minha espera?

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