Ela diz que é o contrário, que ela não pode esquecê-lo.
que a partir do momento em que não se passa nada entre eles, fica a memória
infernal
daquilo que não acontece.
Marguerite
Duras
Escrevo-te na
convicção certeira de que tudo entre nós se passa sempre cedo de mais ou tarde
de mais. E mesmo que estivessemos ambos no mesmo sítio e à mesma hora ambos faltaríamos
ao encontro. Ás vezes foi isso que nos faltou. Estivemos frente a frente de
mãos dadas e não nos apercebemos. Outras estivemos muito longe um do outro,
sempre longe o suficiente para não haver nenhuma dúvida; até que sentimos que
distância alguma apagaria este traçado de não-vivido que nos assombra. Tudo o
que não aconteceu entre nós ganhou um brilho vivo, fluorescente, que nos
orienta. Aquela sensação de que as coisas entre nós nunca foram como deviam
ser, acende-se como uma faísca. Tímida e incerta e duvidosa. Mas sempre, de
cada vez, mais consistente.
Mas não é assim que
as pessoas se apaixonam, e isto não pode ser amor. É outra coisa de certo para
a qual ainda não inventaram o nome. Durante este tempo, estivemos apaixonados
tanta vez – por outras pessoas claro está -
e portanto ambos sabemos que a isto não se chama amor. Isto é o que
sobrevive a todas as paixões, o que nos vive debaixo da pele. A inconstância
rídicula das borboletas no estômago quando nos vemos, quer tenham passado cinco
minutos ou dez anos.
Hoje sei que nunca
estaremos juntos. A mesma força que misteriosamente nos empurra subtilmente por
baixo da camada de pele, repele-nos furiosamente à superficie. Somos
diferentes. Somos muito diferentes nas coisas em que somos muito iguais. Mas há
uma corrente elétrica poderosa que nos impede de viver como duas pessoas
apaixonadas: Eu acho sempre que tu és perfeito demais para mim, Tu achas
porventura que terias de ser melhor do que és. Ás vezes dou por mim a pensar
que não temos razão. E que todas estas incompatibilidades são uma forma
retorcida de demonstração de que somos absolutamente perfeitos um para o outro.
Mas isso dura um breve segundo, quando me lembro dos pequenos presentes que me
deste - e que eu guardei – e da música
que tocavas só para mim. Depois, abano a cabeça e penso que tudo isto só existe
no plano confuso da minha cabeça. Que não estamos juntos porque tu não queres.
E então, eu também não quero. E nada acontece. E por isso, é um inferno
esquecer-te.