O calor toldava os olhos, os sentidos.
E algures surgia um campo de searas amarelas. E um vento esguio. Havia um azul pastel que espreitava de cima, afastando as espigas que baloiçavam entre sussurros.
Com um cansaço extenuante a pele macia assentava na terra fresca. O toque sedoso da volúpia da seara.
Era a escolha certa.
Porque era a primeira.
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Friday, May 29, 2009
Thursday, May 28, 2009
Resgate
Que masmorras são estas? Que correntes são estas?
Porque é que fazes isto? Porque é que enches as flores de veneno?
Sujas o ar com esse movimento frenético de ser pequeno.
Preferes o reinado num mundo ignorante que aplaude a música sem a ouvir. Eu sempre preferi a solidão do infinito. Dos espaços vazios que não vou ter tempo para preencher.
E tu és tão monótono. Sim, és monótono.
E estas masmorras que me inventas são uma forma de continuares rei num mundo cheio de mendigos, demasiado cegos para verem que um dia terão um reflexo no espelho do tempo.
Eu não posso demorar. Não te estou a roubar o teu trono. Não te invejo. Não te ambiciono.
Só quero que não fundas o meu mundo numa alegre e social harmonia com o teu.
Eu sou marcadamente melódica.
E tu és tão insignificante que podes estragar-me a vida.
Porque é que fazes isto? Porque é que enches as flores de veneno?
Sujas o ar com esse movimento frenético de ser pequeno.
Preferes o reinado num mundo ignorante que aplaude a música sem a ouvir. Eu sempre preferi a solidão do infinito. Dos espaços vazios que não vou ter tempo para preencher.
E tu és tão monótono. Sim, és monótono.
E estas masmorras que me inventas são uma forma de continuares rei num mundo cheio de mendigos, demasiado cegos para verem que um dia terão um reflexo no espelho do tempo.
Eu não posso demorar. Não te estou a roubar o teu trono. Não te invejo. Não te ambiciono.
Só quero que não fundas o meu mundo numa alegre e social harmonia com o teu.
Eu sou marcadamente melódica.
E tu és tão insignificante que podes estragar-me a vida.
Sunday, May 24, 2009
Frase do dia
"Tu gostas de toda a gente, o que equivale a dizer que todos te são indiferentes"
In "O retrato de Dorian Gray" - Oscar Wilde
Gostar dos gregos e detestar os troianos é demonstrar ter personalidade. Só as pessoas que fazem um ridículo esforço por se adaptarem é que podem gostar de toda a gente. E gostando de toda a gente são indiferentes a tudo. Até a elas próprias.
In "O retrato de Dorian Gray" - Oscar Wilde
Gostar dos gregos e detestar os troianos é demonstrar ter personalidade. Só as pessoas que fazem um ridículo esforço por se adaptarem é que podem gostar de toda a gente. E gostando de toda a gente são indiferentes a tudo. Até a elas próprias.
Friday, May 22, 2009
Sincronismo
Talvez tudo isto, todo o tormento tenha sido um palco secundário. Uma estrada dura de passagem. Talvez o fim ainda não tenha chegado.
Talvez o meu amor desumano e incondicional não o fosse se não me tivesses encontrado com os pés fora do Mundo e o coração apertado e encarquilhado naquele rigor mortis aflitivo.
Talvez este não seja ainda o grande e triste fim, justamente porque acreditei que era.
Talvez tudo não passe dum sincronismo perfeito.
Talvez o meu amor desumano e incondicional não o fosse se não me tivesses encontrado com os pés fora do Mundo e o coração apertado e encarquilhado naquele rigor mortis aflitivo.
Talvez este não seja ainda o grande e triste fim, justamente porque acreditei que era.
Talvez tudo não passe dum sincronismo perfeito.
Monday, May 18, 2009
This is the end my friend
Cheguei ao fim de uma época.
Mas o fim nunca é abrupto, excepto quando o entendemos.
E as oportunidades de recomeço que julgamos serem, afinal não são. Representam apenas laivos últimos duma realidade que não quer morrer e se esforça por nos ludibriar.
São apenas sereias que desviam Ulisses. Sereias falsas que devagar se afastam do nosso coração e perdem o encanto. Até vermos que afinal não são a nossa Penélope. Afinal são apenas uma alternativa singela e triste. Uma cópia rancorosa. Sem perigo.
E nesse dia, cortamos as amarras. E entendemos que o fim chegou.
Mas o fim nunca é abrupto, excepto quando o entendemos.
E as oportunidades de recomeço que julgamos serem, afinal não são. Representam apenas laivos últimos duma realidade que não quer morrer e se esforça por nos ludibriar.
São apenas sereias que desviam Ulisses. Sereias falsas que devagar se afastam do nosso coração e perdem o encanto. Até vermos que afinal não são a nossa Penélope. Afinal são apenas uma alternativa singela e triste. Uma cópia rancorosa. Sem perigo.
E nesse dia, cortamos as amarras. E entendemos que o fim chegou.
Sunday, May 17, 2009
Heavy metal Soul
Fim de se semana de Super Arraial no IST. Na sexta-feira, ouvimos David Fonseca. Sempre gostei deste rapaz, não sei muito bem porque. Talvez seja a ousadia de se expressar em inglês.
Na noite seguinte Macacos do Chinês, que surpreenderam pela originalidade, apesar de tocarem um estilo que não é definitivamente o meu.
Mas quando a noite chegou aos Expensive Soul, eu era já uma pessoa cansada. Talvez esteja a torna-me numa fundamentalista. Talvez.
O certo é que sentia saudades do meu heavy metal e tive de encher os ouvidos de Metallica e Iron Maiden. E foi como voltar a casa com alívio.
O metal descreve-me. Já estou demasiado dependente. Ou demasiado lúcida.
Consigo afastar-me até David Fonseca.
Mas não muito mais do que isso.
Na noite seguinte Macacos do Chinês, que surpreenderam pela originalidade, apesar de tocarem um estilo que não é definitivamente o meu.
Mas quando a noite chegou aos Expensive Soul, eu era já uma pessoa cansada. Talvez esteja a torna-me numa fundamentalista. Talvez.
O certo é que sentia saudades do meu heavy metal e tive de encher os ouvidos de Metallica e Iron Maiden. E foi como voltar a casa com alívio.
O metal descreve-me. Já estou demasiado dependente. Ou demasiado lúcida.
Consigo afastar-me até David Fonseca.
Mas não muito mais do que isso.
Thursday, May 14, 2009
Explicação
Há momentos em que tenho saudades tuas.
Assim, como quem não quer nada. E quer tudo.
Relâmpagos claros espalham o desincronismo de uma onda que não está em fase e soa mal.
E eu sinto a falta. Os tentáculos do meu coração apalpam a ausência que me trazes e eu tenho saudades.
Porque algures em mim existe uma compreesão gravada. (A saudade não é mais do que um desejo desesperado de permanência de uma memória boa.)
E essa memória boa vem da tua música. Ou seja, vem de ti.
E eu tenho-te saudades.
Assim, como quem não quer nada. E quer tudo.
Relâmpagos claros espalham o desincronismo de uma onda que não está em fase e soa mal.
E eu sinto a falta. Os tentáculos do meu coração apalpam a ausência que me trazes e eu tenho saudades.
Porque algures em mim existe uma compreesão gravada. (A saudade não é mais do que um desejo desesperado de permanência de uma memória boa.)
E essa memória boa vem da tua música. Ou seja, vem de ti.
E eu tenho-te saudades.
Tuesday, May 12, 2009
Reflexões
A história do Patinho Feio sempre despertou em mim uma interessante reflexão sobre a beleza.
Tendo a condenar à partida a pura avaliação na beleza física que tantos seres humanos fazem uns dos outros. Essa rejeição vem-me dos tempos da escola onde vi tantos patinhos feios (eu era um deles certamente) serem afastados do lago comum, por não serem cisnes.
Mas sendo a beleza tão subjectiva, porque é que é tão social?
A beleza é subjectiva. E é mutável, como a História. No entanto mantém um padrão constante durante épocas distintas. O que se condena é a fuga a esse padrão. A existência de um icon que é diferente do resto. Se no lago nadassem mais patos feios, eles provavelmente achar-se-iam todos lindos. Ou por um motivo instintivo de selecção natural, sentir-se-iam atraídos pelo único cisne, sendo aí a diferença irremediavelmente irresistível.
A condenação por nós humanos, das pessoas feias (como se fosse uma doença contagiosa) é um sinónimo de futilidade, sempre achei. Quanto mais complexo e profundo é o ser humano mais detalhes e deliberações, consegue fazer acerca de outro ser humano. E consegue, à luz de instintos psicológicos entender a personalidade do “outro” e ter opinião para gostar dela ou não.
E aí existe outro tipo de beleza. A da personalidade.
Dizia Oscar Wilde “Só as pessoas fúteis não julgam pela aparência”.
Porque para os fúteis não existe aparência. A aparência é a pessoa.
Quem ultrapassa essa camada superficial de percepção sensorial, está apto a julgar pelas aparências. Ou não.
Quem ultrapassa essa camada superficial tem um mundo de complexidades tão apaixonantes como perigosas. E aí podemos julgar a pessoa do lado pela sua inteligência, pela sua simpatia ou pela forma como deixa a porta aberta.
E quanto mais fundo formos descendo nesta análise (e mais alta se torna a nossa consciência) de possibilidades e reentrâncias do ser humano, mais nos vamos guiando e julgando por características aparentemente desconexas.
Daí que apenas dois tipos de pessoas possam experienciar o amor à primeira vista: as fúteis (ou superficiais), que vêem num momento a beleza física que as atrai; e as mais profundas que vêem nesse físico o resultado palpável duma avaliação psicológica relâmpago da personalidade e consciência que presenciam. E no limite, as características físicas poderão mesmo ser um factor decisivo para a pessoa profunda. Uma rápida análise social determina as características potenciais de uma pessoa alta ou magra, loirou ou morena, face ao enquadramento onde se insere.
Ambos os sentimentos de amor são contudo baseados em beleza. E repare-se, ambos são baseados em beleza física. No primeiro caso ela não é fruto de nenhuma ilusão de óptica. No segundo é.
Mas a verdade é que todas as pessoas procuram a beleza, quer sejam ou não fúteis. Seja ou não uma ilusão de óptica. Quer a beleza seja beleza ou seja inteligência ou simpatia.
E isso acontece porque gostamos de nós. E queremos sentir-nos bem. Queremos ter vantagens. E assim, gostamos da pessoa inteligente, que sabe resolver a situação. Ou da simpática porque nos ouve. Ou da que deixa a porta aberta, porque será uma pessoa que nos dê liberdade.
E somos tão fúteis quanto os fúteis. Gostamos tão condicionalmente quantos eles. Apenas temos consciência e orientamos a escolha segundo um referencial diferente.
Porque estamos de uma forma geral, sempre condicionados. O nosso amor é condicionado. Aquilo que somos e damos. E esperamos. Está mutuamente condicionado. Àquilo que recebemos.
Será que um dia será possível amar sem condição? Sem ter vantagens, físicas ou psicológicas? Sem ter partilha. Sem ter razão. (O amor que existe tem sempre uma razão, ainda que se julgue que não).
Seremos um dia integralmente capazes de amar realmente uma pessoa feia?
Tendo a condenar à partida a pura avaliação na beleza física que tantos seres humanos fazem uns dos outros. Essa rejeição vem-me dos tempos da escola onde vi tantos patinhos feios (eu era um deles certamente) serem afastados do lago comum, por não serem cisnes.
Mas sendo a beleza tão subjectiva, porque é que é tão social?
A beleza é subjectiva. E é mutável, como a História. No entanto mantém um padrão constante durante épocas distintas. O que se condena é a fuga a esse padrão. A existência de um icon que é diferente do resto. Se no lago nadassem mais patos feios, eles provavelmente achar-se-iam todos lindos. Ou por um motivo instintivo de selecção natural, sentir-se-iam atraídos pelo único cisne, sendo aí a diferença irremediavelmente irresistível.
A condenação por nós humanos, das pessoas feias (como se fosse uma doença contagiosa) é um sinónimo de futilidade, sempre achei. Quanto mais complexo e profundo é o ser humano mais detalhes e deliberações, consegue fazer acerca de outro ser humano. E consegue, à luz de instintos psicológicos entender a personalidade do “outro” e ter opinião para gostar dela ou não.
E aí existe outro tipo de beleza. A da personalidade.
Dizia Oscar Wilde “Só as pessoas fúteis não julgam pela aparência”.
Porque para os fúteis não existe aparência. A aparência é a pessoa.
Quem ultrapassa essa camada superficial de percepção sensorial, está apto a julgar pelas aparências. Ou não.
Quem ultrapassa essa camada superficial tem um mundo de complexidades tão apaixonantes como perigosas. E aí podemos julgar a pessoa do lado pela sua inteligência, pela sua simpatia ou pela forma como deixa a porta aberta.
E quanto mais fundo formos descendo nesta análise (e mais alta se torna a nossa consciência) de possibilidades e reentrâncias do ser humano, mais nos vamos guiando e julgando por características aparentemente desconexas.
Daí que apenas dois tipos de pessoas possam experienciar o amor à primeira vista: as fúteis (ou superficiais), que vêem num momento a beleza física que as atrai; e as mais profundas que vêem nesse físico o resultado palpável duma avaliação psicológica relâmpago da personalidade e consciência que presenciam. E no limite, as características físicas poderão mesmo ser um factor decisivo para a pessoa profunda. Uma rápida análise social determina as características potenciais de uma pessoa alta ou magra, loirou ou morena, face ao enquadramento onde se insere.
Ambos os sentimentos de amor são contudo baseados em beleza. E repare-se, ambos são baseados em beleza física. No primeiro caso ela não é fruto de nenhuma ilusão de óptica. No segundo é.
Mas a verdade é que todas as pessoas procuram a beleza, quer sejam ou não fúteis. Seja ou não uma ilusão de óptica. Quer a beleza seja beleza ou seja inteligência ou simpatia.
E isso acontece porque gostamos de nós. E queremos sentir-nos bem. Queremos ter vantagens. E assim, gostamos da pessoa inteligente, que sabe resolver a situação. Ou da simpática porque nos ouve. Ou da que deixa a porta aberta, porque será uma pessoa que nos dê liberdade.
E somos tão fúteis quanto os fúteis. Gostamos tão condicionalmente quantos eles. Apenas temos consciência e orientamos a escolha segundo um referencial diferente.
Porque estamos de uma forma geral, sempre condicionados. O nosso amor é condicionado. Aquilo que somos e damos. E esperamos. Está mutuamente condicionado. Àquilo que recebemos.
Será que um dia será possível amar sem condição? Sem ter vantagens, físicas ou psicológicas? Sem ter partilha. Sem ter razão. (O amor que existe tem sempre uma razão, ainda que se julgue que não).
Seremos um dia integralmente capazes de amar realmente uma pessoa feia?
Sunday, May 10, 2009
Thursday, May 07, 2009
Funeral
No outro dia sonhei com a tua morte.
Estava na rua e de repente, senti que morrias. Diziam-me de mansinho que tinhas morrido. Uma electricidade desagradável percorreu todo o meu corpo até os olhos se encherem de lágrimas fáceis. E uma tristeza cavada apoderou-se de mim.
Morreste, disseram. Morreste longe. A tentar regressar? (Talvez a única especulação inventiva do meu sonho) Não interessa. Morreste, disseram.
E portanto morreu definitivamente toda a esperança de voltar a ver-te. De entender-te. De tentares. Morreu para sempre a esperança de ainda quereres mudar as coisas. Ainda quereres salvar o que de tão pouco ficou. Ainda que seja o vazio, é alguma coisa.
E ali estava eu. No teu funeral. Percorri léguas infinitas para lá chegar. Ao fim do Mundo. A minha derradeira viagem, onde desta vez a desilusão fui eu. (Entre nós, as viagens acabarão sempre mal.)
Fiquei só eu no fim. Onde estavam todos os outros? Não sei. Talvez eu não os visse. Talvez não existissem. O tempo passou e eu tinha-me esquecido que só tu existias para mim.
Agora acabavas de "não-existir". E eu estava só, num cemitério verde, com pequena uma rosa vermelha. Que deixei contigo.
E pela segunda vez deixei-te tudo o que tinha.
E pela segunda vez não podias fazer nada com o que eu te dava.
Alice
Estava na rua e de repente, senti que morrias. Diziam-me de mansinho que tinhas morrido. Uma electricidade desagradável percorreu todo o meu corpo até os olhos se encherem de lágrimas fáceis. E uma tristeza cavada apoderou-se de mim.
Morreste, disseram. Morreste longe. A tentar regressar? (Talvez a única especulação inventiva do meu sonho) Não interessa. Morreste, disseram.
E portanto morreu definitivamente toda a esperança de voltar a ver-te. De entender-te. De tentares. Morreu para sempre a esperança de ainda quereres mudar as coisas. Ainda quereres salvar o que de tão pouco ficou. Ainda que seja o vazio, é alguma coisa.
E ali estava eu. No teu funeral. Percorri léguas infinitas para lá chegar. Ao fim do Mundo. A minha derradeira viagem, onde desta vez a desilusão fui eu. (Entre nós, as viagens acabarão sempre mal.)
Fiquei só eu no fim. Onde estavam todos os outros? Não sei. Talvez eu não os visse. Talvez não existissem. O tempo passou e eu tinha-me esquecido que só tu existias para mim.
Agora acabavas de "não-existir". E eu estava só, num cemitério verde, com pequena uma rosa vermelha. Que deixei contigo.
E pela segunda vez deixei-te tudo o que tinha.
E pela segunda vez não podias fazer nada com o que eu te dava.
Alice
Kurt Cobain
Há um Kurt Cobain moribundo dentro de mim. Hoje.
O mesmo que tocou em New York. O mesmo que já sabia que o fim estava perto.
Talvez ele não soubesse. Mas sabia o coração. O cabelo. O sorriso. As roupas. A sua atmosfera apercebeu-se antes dele. Há coisas que não se suportam.
E ele tinha um ar simpaticamente cansado. Sem remorsos ou culpas.
Sem raiva ou medo.
O ar de quem fez uma viagem longa, muito longa. E cansativa.
Mas apaziguadora.
Esse Kurt Cobain moribundo e calmo está aqui comigo hoje. É parte de mim.
Partilhamos essa viagem e esse cansaço.
A música.
PS: Um lamento a todos os ignorantes que não entendem. Há mundos que não se partilham.
O mesmo que tocou em New York. O mesmo que já sabia que o fim estava perto.
Talvez ele não soubesse. Mas sabia o coração. O cabelo. O sorriso. As roupas. A sua atmosfera apercebeu-se antes dele. Há coisas que não se suportam.
E ele tinha um ar simpaticamente cansado. Sem remorsos ou culpas.
Sem raiva ou medo.
O ar de quem fez uma viagem longa, muito longa. E cansativa.
Mas apaziguadora.
Esse Kurt Cobain moribundo e calmo está aqui comigo hoje. É parte de mim.
Partilhamos essa viagem e esse cansaço.
A música.
PS: Um lamento a todos os ignorantes que não entendem. Há mundos que não se partilham.
Wednesday, May 06, 2009
Lose Yourself
Há uma vida feia em redor. Ou um espírito retorcido numa bela vida. Tanto faz.
As casas são feias. As pessoas são feias.
O mundo é áspero e autodestrutivo. Existe um fado peganhento que te arrasta para a tradição dum passado que não se reconhece.
Tudo é monotonamente violento. E é absolutamente previsível esse gesto de desonra. De tantas traições que ali se aceitam, escolhe-se a única que é proibida.
Não haverá outro círculo talvez. Tudo está partido e estragado. E a vida habituou-se a uma deformação, com uma capacidade humana de moldagem que a deficiência dum espírito revolto não inclui.
E espera-se a oportunidade. Todos os dias, todas as horas. Ela não chega. Todos os minutos, todos os segundos. Ela não chega.
E as casas são feias. As pessoas são feias.
O círculo é o mesmo. O presente é a tradição do passado. E para quebrar o círculo agarra-se essa corda recta de esperanças. E espera-se a oportunidade. E treinam-se os músculos. O coração. Porque será a oportunidade. E não há lugar para a falha. Não haverá outra.
É conscientemente única.
As casas são feias. As pessoas são feias.
O mundo é áspero e autodestrutivo. Existe um fado peganhento que te arrasta para a tradição dum passado que não se reconhece.
Tudo é monotonamente violento. E é absolutamente previsível esse gesto de desonra. De tantas traições que ali se aceitam, escolhe-se a única que é proibida.
Não haverá outro círculo talvez. Tudo está partido e estragado. E a vida habituou-se a uma deformação, com uma capacidade humana de moldagem que a deficiência dum espírito revolto não inclui.
E espera-se a oportunidade. Todos os dias, todas as horas. Ela não chega. Todos os minutos, todos os segundos. Ela não chega.
E as casas são feias. As pessoas são feias.
O círculo é o mesmo. O presente é a tradição do passado. E para quebrar o círculo agarra-se essa corda recta de esperanças. E espera-se a oportunidade. E treinam-se os músculos. O coração. Porque será a oportunidade. E não há lugar para a falha. Não haverá outra.
É conscientemente única.
E tu foste a minha oportunidade única. Que falhou.
Lose Yourself - Eminem
Tuesday, May 05, 2009
Verão sempre me soube a maçãs
Verão sempre me soube a maçãs.
Era uma manhã de sol, aquele calor quente que nos trinca os músculos devagarinho.
Cheirava a fruta, a cores. E a escola era verde, natural.
E o Verão era este marasmo enérgico onde todas as horas eram boas. As roupas eram leves. Os sorrisos eram calmos e bons. Havia uma felicidade estagnada que de tão entranhada, era já estável. Era bom estar ali. E era bom não estar. Pensar no cheiro doce da praia que se adivinhava. Nas horas de sossego na toalha, onde os olhos fechados viam manchas cor-de-laranja. O cheiro do mar em todo o lado, na roupa, na almofada. Na pele.
Era bom estar ali a pensar nisso. A ver o horizonte do céu invariavelmente azul e a prever os salpicos das ondas. Os peixes, os caranguejos. As noites curtas e o adormecer de mansinho sob o cabelo áspero do sal. E ao mesmo tempo ensaiar a peça de teatro. Colorir o cenário que faltava. Correr sem parar debaixo do sol gentil de Junho e inspirar fundo o cheiro dos Manjericos e das alças frescas dos vestidos. Tanto o presente como futuro eram eternamente felizes. E não guerreavam.
Lembro-me dessa manhã de Junho, onde tive consciência de tudo isto. E cheirava a maçãs.
Era uma manhã de sol, aquele calor quente que nos trinca os músculos devagarinho.
Cheirava a fruta, a cores. E a escola era verde, natural.
E o Verão era este marasmo enérgico onde todas as horas eram boas. As roupas eram leves. Os sorrisos eram calmos e bons. Havia uma felicidade estagnada que de tão entranhada, era já estável. Era bom estar ali. E era bom não estar. Pensar no cheiro doce da praia que se adivinhava. Nas horas de sossego na toalha, onde os olhos fechados viam manchas cor-de-laranja. O cheiro do mar em todo o lado, na roupa, na almofada. Na pele.
Era bom estar ali a pensar nisso. A ver o horizonte do céu invariavelmente azul e a prever os salpicos das ondas. Os peixes, os caranguejos. As noites curtas e o adormecer de mansinho sob o cabelo áspero do sal. E ao mesmo tempo ensaiar a peça de teatro. Colorir o cenário que faltava. Correr sem parar debaixo do sol gentil de Junho e inspirar fundo o cheiro dos Manjericos e das alças frescas dos vestidos. Tanto o presente como futuro eram eternamente felizes. E não guerreavam.
Lembro-me dessa manhã de Junho, onde tive consciência de tudo isto. E cheirava a maçãs.
Monday, May 04, 2009
TITANIC
E no meio da futilidade surge a urgência duma vida que não se vive.
Gostava de viver. O meu pedido humilde resume-se a essa frase. A essa palavra.
Viver.
Talvez pedir para descer ao porão e dançar aquela música irlandesa seja muita soberba. Talvez aquela vida suja e medíocre não esteja ao meu alcance. Talvez o meu mundo seja eternamente um convés bonito. Onde se sonha com essa possibilidade utópica.
Onde sonho constantemente com essa possibilidade. De ver a vida como um trôpego rolar de emoções. Um aglomerar de instantes eternos. Uma lâmina afiada a cada segundo junto ao coração.
No convés o coração é uma porcelana bonita.
Mas talvez seja arrogância querer viver. Há escravos do porão que nunca verão a luz do sol. E eu quero abandonar tudo o que tenho.
Gostava de viver. O meu pedido humilde resume-se a essa frase. A essa palavra.
Viver.
Talvez pedir para descer ao porão e dançar aquela música irlandesa seja muita soberba. Talvez aquela vida suja e medíocre não esteja ao meu alcance. Talvez o meu mundo seja eternamente um convés bonito. Onde se sonha com essa possibilidade utópica.
Onde sonho constantemente com essa possibilidade. De ver a vida como um trôpego rolar de emoções. Um aglomerar de instantes eternos. Uma lâmina afiada a cada segundo junto ao coração.
No convés o coração é uma porcelana bonita.
Mas talvez seja arrogância querer viver. Há escravos do porão que nunca verão a luz do sol. E eu quero abandonar tudo o que tenho.
Exceptuando que tudo o que tenho não é nada.
Alice
Sunday, May 03, 2009
Disputa
Que noite vazia. A música ecoava de dentro para fora. Talvez o som do palco não fosse mais do que o grito desesperado dum pequeno mundo que ali ruiu. E que desmorou de pé, para não incomodar.
E ouviu-se ali um fado triste entre a guitarra eléctrica. O meu fado.
E depois chegou o vazio. Quente, intimista, sufocante. Quente.
E onde estás tu? Onde estás tu? Ah, estavas ali. E a noite ganhou novas estrelas. Não melhores nem mais. Apenas outras. E a forma como existias fez-me ter pena de mim. Ou ter uma saudade fraca, quase cobarde. Porque fui eu que faltei. Não há lugar para mim e para essa noite em simultâneo. E ela foi mais forte.
E ouviu-se ali um fado triste entre a guitarra eléctrica. O meu fado.
E depois chegou o vazio. Quente, intimista, sufocante. Quente.
E onde estás tu? Onde estás tu? Ah, estavas ali. E a noite ganhou novas estrelas. Não melhores nem mais. Apenas outras. E a forma como existias fez-me ter pena de mim. Ou ter uma saudade fraca, quase cobarde. Porque fui eu que faltei. Não há lugar para mim e para essa noite em simultâneo. E ela foi mais forte.
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