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Friday, June 18, 2010

Viking girl


Podes perguntar-te várias vezes se isto não é uma incoerência. Se tudo o que eu digo que sinto não me fica afinal apenas na pele.
Se os esforços que faço para largar este pontinho minúsculo no meio do Universo que é a minha casa em Lisboa não são apenas frases de engate que seduzem um trago maior do que a vulgaridade.



Quantas vezes ele me disse que eu nunca sairia daqui. Que quem fala, nunca age. E a minha fúria atada inquietava-se sem lágrimas. Porque eu sempre fui nórdica, até na minha tristeza.
Ele sim, nunca sairia daqui! Eu sempre soube onde era a minha casa. E não confundas a minha certeza com a certeza dos vagabundos que ao meu lado, no prédio de Lisboa, se contorcem com as vitórias duma selecção que alguém escolheu por eles.

Eu tenho uma casa, sim. Tenho um hino. Tenho um país. Mas não me julgues, como ele me julgava. Eu não quero trocar uma casa por outra, como um miúdo birrento que olha para o brinquedo do lado e quer sempre mais.
Não ando à procura de uma vida mais confortável. Ando à procura de vida.

E quero ver a Patagónia e a Austrália e quero sentir o sangue a ferver, como nestes dias em que sei que vou viajar e já sinto a aceleração da descolagem dentro de mim.
Sabes? Entrar num aeroporto e sentir-me viva de repente, como se tivessem desligado o piloto automático que me controla.
É aí que me conheces. Essa sou eu. No resto do tempo é uma cópia mole, adaptada à vida que este país decidiu chamar vida.
E não julgues, como ele julgava, que sou uma tonta qualquer sem destino fustigada pelas memórias. Ou que te seduzo com esta minha hospitalidade de ter a estrada como casa permanente.

Porque quando o Mundial chega, e o hino toca, o meu coração agita-se pelo meu país. Porque a Dinamarca mora em mim, com os seus vikings pragmáticos, os seus silêncios glaciares e um estilo de vida sempre vanguardista em que todas as pessoas são possíveis, mesmo aquelas que como eu, vivem em casa à distância.

Tuesday, June 15, 2010

Ao Léon

Les grandes personnes aiment les chiffres. Quand vous parlez d’un nouvel ami, elles ne vous questionnent jamais sur l’essentiel. Elles ne vou dissent jamais: “quell est le son de sa voix? Quels sont les jeux qu’il préfère? Est-ce qu’il collectionne les papillons?"
Elles vous demandent
“Quel âge a-t-il? Combien a-t-il de frères? Conbien gagne son père?"

Le petit prince

Foi a primeira vez em que pensei na matemática de forma diferente. Foi a primeira vez em que os números no meu caderno de quadrados olharam para mim como se fossem estranhos de rua, com um sorriso disfarçado e uma implícita atitude pré-concebida, de quem calcula.
Ironicamente, eu que tanto gostava de matemática, nunca calculava.
Foi, desde que me lembro, a primeira vez em que me senti sozinha. E comecei por odiar o Saint-Exupéry na sua eterna história diabólica sobre as pessoas grandes e a fixação pelos números.
E eu até tinha gostado do prólogo. Lembro-me que li vezes sem conta aquelas frases sobre o Léon. E pensava nele com mais cuidado do que pensava no principezinho que tinha a sua rosa, ou no Saint-Exupéry que tinha o principezinho.
Às vezes, à noite, ainda dou por mim a pensar nele, que não tinha nada e passava fome e passava frio. Dantes, até imaginava um romance vadio com esse francês moribundo que conservava intacto um coração. Sempre me pareceu a alma perfeita para amar.
Mas isso era dantes, em que havia sonhos e eu não era caloira. Hoje continuou a pensar nele, na sua breve passagem pelo mundo naquele prólogo daquele livro que me roubou a matemática. Mas o romance ficou preso dentro do livro e nunca mais voltou.

Dizem que eu aprendi a fazer contas antes de falar. E nunca me serviram as palavras, quando as usei na escola. Desde cedo que o Mundo não quis comunicar comigo e eu encontrei na matemática uma exactidão universal que bania da minha vida os incompetentes e os falaciosos.
Porque os números abstractos nunca me mentiam.

Até aquele dia em que li o Principezinho. E o Léon me aparecia de noite a morrer numa rua sem nome e me dizia “ As pessoas grandes só pensam em números”. E olhava para mim de forma desiludida e morria sem fazer barulho.
E nunca consegui deixar de sentir a desilusão dele. Sempre que comprava cadernos de quadrados. Sempre que passava a mais uma cadeira do meu curso de engenharia. Sempre que resolvia uma equação.
E sempre que passo mais tempo com os números e eles me dão um pedaço do velho descanso da minha infância é a voz do Léon dos meus sonhos que oiço.
E dou por mim com a garganta presa por palavras que nunca saem “Eu nunca quis crescer!”

Hoje, vou voltar para os números, porque afinal eu nunca soube comunicar e as palavras nunca quiseram o meu amor infantil. Há talvez um mundo paralelo onde eu existo e que seria difícil de conceber para o Saint Exupery.
Por isso, antes de voltar para os números num amor resistente e desgastado em discussões de intimidade,

Gostava de pedir desculpa ao Léon pela minha falha abstracta imperdoável. E garantir-lhe que nunca vou crescer.

Monday, June 14, 2010

Saturday, June 12, 2010

A Queda do Muro de Berlim

Como se comer, beber e dormir com roupa quente fosse liberdade. Como se escolher o melhor caminho, fosse liberdade. Como se nunca ver o Mundo fosse liberdade.
Consideras a liberdade como um bem menor, um consumo supérfluo. A metáfora coloca-a debaixo da redoma, como se fosse muito frágil essa liberdade.

Sempre considerei as redomas como prisões e qualquer metáfora como uma grade da jaula. Lamento quebrar essa fina capa de ilusão na qual não ter frio é um nobre propósito. A morte é dura, eu sei. Mas a verdade é que quando morremos, todos temos frio.
E eu conto com um cobertor na alma mais quente do que todas as mantas que arranjas enquanto não atravessas fronteiras, não cedes a tentações e vives numa aldeia confortável onde todos são iguais e escondem a ambição debaixo do tapete.

Eu sei que a liberdade é tenebrosa. Tal como é o silêncio no qual tu desenhas os teus pensamentos e crias a tua filosofia.

Mas a liberdade é isso mesmo, esse caminho rebelde e teimoso. Pode ser medíocre ou pode ser genial.
Mas se não for irresponsável, nunca será livre.

Qualquer coisa que construas sem liberdade, não é verdade.
Não existe.
Todo esse frio que evitas é uma ilusão.

E um dia a verdade acaba sempre por bater à porta.
E mais vale que os muros não estejam lá para te separar dela.


Em memória do Muro que caiu em Berlim, a 16 de Agosto de 2009.

Friday, June 11, 2010

10 de Junho

A morte comemorada assim
Entrou na minha casa,
De madrugada.

E enquanto me alinhavava
com essas agulhas toscas
e mal afiadas,
a morte comemorada assim
cobria os meus livros
obrigatórios
cheios de rimas estratégicas
e nobres objectivos.

Mas não são permitidos
Livros obrigatórios
Enquanto se cose
um ser humano de trapos
e de saudades.
E a poesia nunca
teve
um propósito.

Sou livre para nunca
Gastar as minhas mãos
Em livros obrigatórios
Mas antes ensaiar em mim
Uma camada de recheio
Que de vez em quando
Solta versos
Que nunca estarão
Disponíveis para leres
em bibliotecas construídas
de propósitos.

Monday, June 07, 2010

A mão de Deus

Dois bafos de cigarro.
Duas noites e dois copos de vodka.
Eis o espaço que dou a perguntas
alheias.
Gosto de deglutir essa ideia
na minha língua.

Nunca gostei de falsas vitórias. Não existe nada
para além do tudo.
A verdade não é ausência de mentira.
E se a desconfiança habita a planície aberta,
a imensidão do silêncio
transcende o teu eco.

Mas as verdades habitam silêncios puros,
E não têm raízes.
Por isso, se não amas
mais vale que eu
o saiba agora.
Grita-o nesse vento
latino que nunca destrói a pampa
seca.
Não marques um golo como o Maradona.
Posso sobreviver a uma derrota,
mas nunca me chegaria orgulho
para regar
uma vitória inventada.

Wednesday, June 02, 2010

Incompreensão

Dantes, a depressão viveu em mim.
Deixei de comer e de dormir. Deixei de escolher a roupa para me vestir de manhã. Deixei de escovar o cabelo. Deixei de carregar no botão do Play do mp3.
Deixei de ir ao café ou a festas. Deixei de sair sozinha. Deixei de escrever.
Deixei de querer viajar.
Deixei de estar à janela.
Deixei de abrir o computador. Deixei de ver fotografias.
Deixei de ver televisão. Deixei de ir ao cinema. Deixei de comer pipocas.
Deixei de comprar roupa. Deixei de ir ao curso de alemão.
Deixei de trabalhar. Deixei de saber onde estava o telemóvel.
Deixei de ler.
Deixei de receber prendas ou visitas.
Deixei de ver jogos de futebol. Deixei de olhar para mapas. Deixei de cozinhar.
Deixei de fumar.

Cicatrizes escondidas dum osso roto,
destapadas por esse amor ligeiro.

Um dia não me sobraram hipóteses:
Deixei-me.

Tuesday, June 01, 2010

Humildade arrogante

Hoje estou num daqueles dias de ego inchado, mas com uma humildade que me credibiliza.
Vá, faz lá esse teu movimento de rotina. De passeio pela mediocridade. Faz essa tua voltinha de circo que arranca aplausos aos outros, não menos ignorantes do que tu.
Em dias como o de hoje, apetece-me bocejar ao som do teu espectáculo. E nem sequer é uma atitude de desprezo. Não pretendo que saibas que te acho ridículo.
Tu és ridículo.
Hoje, vejo-te tão bem cá de cima. Vejo tão bem as tuas rugas enfadonhas e a luta desesperada, quase cómica, para te tentares construir a pessoa perfeita que encaixa no mundo que desejas.
E vejo bem como és feio e desinteressante. Em como tens que compensar todas as carências físicas, com uma inteligência comprada para que estas mulheres olhem para ti e te aceitem. Ou pelo menos, que não te deixem. E aposto em que hoje em dia, isso já é o suficiente para ti.
Vá mostra lá a tua dança de todos os dias. Acredita, que isso vai diminuir com o passar dos tempos.
Já ganhaste a tua mulher para foder todos os dias. E um emprego para poderes brincar aos senhores importantes. O teu “show” é cada vez menos preciso e as luzes apagar-se-ão muito antes de morreres.
Eu nem vou gastar tempo a apupar-te.
Enterra-se contigo o teu fim, todos os dias.

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