Kurt morreu há trinta anos. Tinha eu onze e lembro-me bem de ver anunciada a sua morte na televisão, apesar de não saber bem quem ele era. Antes de ser Nirvana na música, fui Nirvana nas calças e nas camisas e sobretudo no desapego doce que tinha das coisas. Fui Nirvana no meu estado meio andrajoso de ser adolescente. Tinha colegas, já nessa altura, que ouviam Nirvana. Eu não ouvia. Vivia noutro planeta, mais estreito e escuro. E por isso mesmo, talvez já nessa altura só conseguisse vestir Nirvana. Mais tarde, já perto dos vinte, ouvi uma música chamada “Dumb”, cantada pelo Kurt. A versão unplugged, a que mais gosto, cantada nesse concerto mágico - por alguém que está prestes a morrer e sabe- diz que ele é parvo, tão parvo, e se calhar é por isso mesmo que é feliz. Diz que ele não é como eles, os outros. Que a sua luz continua quando o sol acaba, e que ele se diverte mesmo quando o dia já acabou. Uma estranha e parva forma de ser diferente e feliz. Ao ouvir estas palavras e uma melodia que me acompanha até hoje, finalmente o fato de Nirvana serviu-me por inteiro e pude abraçar o Kurt da música. A música era o que faltava. A música é o que falta sempre. Kurt Cobain para mim é honestidade. O descanso eterno de sermos quem somos, a pele mais virgem com que posso ambicionar morrer.
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Friday, April 12, 2024
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