Uma semana em Paris. E o retorno a Lisboa.
A viagem para o cemitério de Pere Lachaise foi feita, o mais possível fora do metro. Faz-se de tudo para evitar aqueles túneis sombrios, os rostos tristes. Desde cedo que para mim, a visita a este local se tornara obrigatória. Mais do que saber se Paris é romântico ou se está inundado de luz, se tens lojas caras ou onde estão os famosos estilistas.
A entrada para o cemitério é pequena, e mesmo em frente ao metro. Isso foi a primeira coisa que me espantou quando lá cheguei: a proximidade entre mortos e vivos. Depois de comprar a planta para que me pudesse orientar, percorri finalmente, as ruas do cemitério alheias aos olhos dos visitantes. Aquelas ruas eram ruas calmas, sombrias, quase tenebrosas. E por isso mesmo convidavam a uma adrenalina extra , a um sentimento com dupla personalidade. Por todo o lado se amontoavam campas, de pedra. Imóveis. Fixas e duras. Altos e trabalhados jazigos onde repousavam famílias inteiras. Os nomes quase desapareciam naquela atmosfera escura, de ferro gasto. Por vezes as ruas não eram definidas. Pequenos lances de escadas levam-nos por uma pequena viagem entre as campas, uma aproximação quase tão proibida como excitante. Corvos isolados faziam-se ouvir no horizonte. As copas altas impediam a visão clara. Felizmente. Aquele cemitério com sol límpido perderia certamente todo o seu semblante.
Paralelamente à minha euforia, o jardim guardava os mortos. E que eram isso mesmo: apenas mortos. Nesse aspecto, o meu amor aquele cemitério era tão despropositado como a inquietude das pessoas que não gostam desta proximidade.
Jim Morrinson foi o último que visitei, depois de Oscar Wilde e Edith Piaf. Ficou estrategicamente para o fim, como um adiamento curto que se faz de uma coisa que se gosta. Estranhamente, o meu coração não parava de bater, numa ansiedade que eu própria estranhei. Ninguém mais do que eu sabe que ali só estão mortos. Disse que gostaria de voltar ao cemitério ao fim da tarde, quase noite. E repito. É nessa hora que os mortos se levantam das sepulturas? Pois bem, era mesmo isso que eu queria ver. Poder falar um pouco com o fantasma do Jim Morrinson... Dizer que durante uma noite inteira ouvi sem parar o “People are strange”. Agradecer-lhe por ter sido uma pessoa diferente, um louco. Que me fez ver que as convenções e as regras são para quem tem uma visão demasiado curta. Que me ensinou que na vida, a nossa única amiga é a música. Que me compreendeu, nas alturas e que fui estranha, em que fui diferentes dos outros, em que me via ao espelho vezes sem conta. Que me compreendeu, repito.
No cemitério de Pere Lachaise são estão mortos. Sim, é verdade. E é uma pena.
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Sunday, April 15, 2007
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1 comment:
A descrição do cemiterio é tao bela e tao perfeita que a vejo agora mesmo! Como um quadro!
E por outro lado, como te compreendo!Em certos momentos, so mesmo alguem como Jim Morrison para nos mostrar a estupidez das convenções. Que as pessoas sao estranhas. Qua há assassinos na estradas. Ou entao, naquelas alturas chave em que so um doido consciente nos compreende. E nos aceita. Porque é, em parte, igual a nos.
Sim, faz-nos falta um Rei Lagarto!Alguem diferente...
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