Sei que o útimo dia do ano ou o
primeiro do ano seguinte são iguais a tantos outros. Como e bebo como sempre,
apago as luzes e deito-me para mim mesma. Há quem festeje toda a noite e grite
desvairada a fugacidade de mais uma porção de tempo que se esvaiu. Para muitos
é só mais um pretexto para beber e para dar uma festa. Para (muitos) outros é
certamente o cumprir de tradições só porque sim. Porque é isso que sempre se
fez e é isso que se tem que continuar a fazer. Põem-se passas na boca, agarra-se
dinheiro enquanto as 12 badaladas vão ribombando e no dia seguinte começa-se de
novo com um grande almoço e roupa nova comprada em tons de azul.
Eu sempre soube que essas
tradições não fazem sentido. No entanto passados já tantos anos novos e tantos anos
velhos, também eu tenho as minhas tradições. Gosto de arrumar os armários e
limpar da minha mesa todos os papeis que por ali se acumularam, rever as
fotografias que tirei nesse ano. Gosto particularmente de pensar onde estava e
quem era no mesmo dia há exactamente um ano atrás. O último dia do ano é assim,
tradicionalmente nostálgico. Finda essa
retrospectiva gosto também de pensar no que eu queria que mudasse, as viagens
que quero fazer, os defeitos que teimosamente vão perpectuando ainda que os
tente afastar. Raramente vou a festas, raramente bebo champagne e ainda mais
raramente me deito para além da meia-noite. Mas quando em certos anos não tenho
os meus armários para arrumar ou não posso percorrer a pé as ruas desertas e
silenciosas na noite de fim de ano, qualquer coisa em mim se agita. E aí percebo que o ritual deixou de ser apenas
um processo mecânico e passou a fazer parte de mim. Eu sou parte das tradições
que criei. Cumpri-las é cumprir quem sou.
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