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Thursday, October 13, 2016

Ela diz que é ao contrário, que não pode esquecê-lo


Ela diz que é o contrário, que ela não pode esquecê-lo.
que a partir do momento em que não se passa nada entre eles, fica a memória infernal
daquilo que não acontece.


Marguerite Duras

Escrevo-te na convicção certeira de que tudo entre nós se passa sempre cedo de mais ou tarde de mais. E mesmo que estivessemos ambos no mesmo sítio e à mesma hora ambos faltaríamos ao encontro. Ás vezes foi isso que nos faltou. Estivemos frente a frente de mãos dadas e não nos apercebemos. Outras estivemos muito longe um do outro, sempre longe o suficiente para não haver nenhuma dúvida; até que sentimos que distância alguma apagaria este traçado de não-vivido que nos assombra. Tudo o que não aconteceu entre nós ganhou um brilho vivo, fluorescente, que nos orienta. Aquela sensação de que as coisas entre nós nunca foram como deviam ser, acende-se como uma faísca. Tímida e incerta e duvidosa. Mas sempre, de cada vez, mais consistente. 
Mas não é assim que as pessoas se apaixonam, e isto não pode ser amor. É outra coisa de certo para a qual ainda não inventaram o nome. Durante este tempo, estivemos apaixonados tanta vez – por outras pessoas claro está -  e portanto ambos sabemos que a isto não se chama amor. Isto é o que sobrevive a todas as paixões, o que nos vive debaixo da pele. A inconstância rídicula das borboletas no estômago quando nos vemos, quer tenham passado cinco minutos ou dez anos.
Hoje sei que nunca estaremos juntos. A mesma força que misteriosamente nos empurra subtilmente por baixo da camada de pele, repele-nos furiosamente à superficie. Somos diferentes. Somos muito diferentes nas coisas em que somos muito iguais. Mas há uma corrente elétrica poderosa que nos impede de viver como duas pessoas apaixonadas: Eu acho sempre que tu és perfeito demais para mim, Tu achas porventura que terias de ser melhor do que és. Ás vezes dou por mim a pensar que não temos razão. E que todas estas incompatibilidades são uma forma retorcida de demonstração de que somos absolutamente perfeitos um para o outro. Mas isso dura um breve segundo, quando me lembro dos pequenos presentes que me deste -  e que eu guardei – e da música que tocavas só para mim. Depois, abano a cabeça e penso que tudo isto só existe no plano confuso da minha cabeça. Que não estamos juntos porque tu não queres. E então, eu também não quero. E nada acontece. E por isso, é um inferno esquecer-te.

1 comment:

pantalaimon said...

"Da primeira vez chegou demasiado cedo; da segunda, demasiado tarde." :)

Gostei muito!

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