"A janela aberta de par em par. O soalho quieto esperando um passo. A noite serena e grave cobrindo tudo com a sua capa de escuridão e mistério. O ar pesado sustentando o silêncio que teima em se fazer ouvir.
Majestosamente o luar entra no quarto e banha tudo com o seu brilho mortiço que aviva a chama das recordações.
Deu dois passos e sentou-se na janela, mas o soalho não respondeu expectante. A Lua ergue-se com a pose de uma rainha que é admirada no cimo, por todos os seus súbditos. E ergue-se com a postura de quem sabe que o seu encanto nasce nos dias em que está escondida.
Olha a Lua e não pode deixar de admira-la lá no alto, vendo tudo, tão segura e determinada. Encanta-a aquela certeza que a mantém no mesmo sítio e que a faz aparecer e desaparecer sempre nos mesmos dias.
De repente baixa os olhos e sente as mãos frias coladas à parede. Será admiração ou simplesmente inveja? O estalido da madeira diz-lhe que a inveja é tão humana como a admiração.
E ao ver as árvores inundadas com aquela estranha luz sente-se regressada ao passado, como se o luar fosse a luz mágica que ilumina o palco onde desfilam as memórias. Talvez seja esse o mistério da lua: não permitir o esquecimento. E talvez seja por isso que se sente tão grata. Limita-se assim a fechar a janela devagar para não quebrar o silêncio, observador discreto e maravilhado."
Lúcia-2000
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Sunday, May 15, 2005
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